Minha inclusão na Polícia Militar vai ser anulada?
- KEOPS CASTRO DE SOUZA
- 7 de mar. de 2023
- 5 min de leitura

Você deu duro, estudou bastante para entrar na polícia militar ou nos Bombeiros. Passou no concurso. Depois, deu mais duro ainda. Iniciou o Curso de Formação e se submeteu a mais estudo e a treinamentos rigorosos durante o dia e a noite. Por causa desse treinamento, muitas vezes insano, você sofreu uma lesão grave. Assim, foi afastado das atividades físicas (não do Curso, pois as aulas continuam) por um longo período para se recuperar. Aí você é surpreendido pela notificação de que a sua inclusão na Corporação vai ser anulada.
E por incrível que pareça, você tem sua inclusão anulada mesmo quando o médico da FSR fez o seu Atestado de Origem (A.O.). Ou seja, mesmo quando o médico atesta que seu acidente foi em decorrência do treinamento, instrução ou serviço a Corporação anula sua inclusão com o argumento de que seu acidente não foi em decorrência do serviço ou que a lesão já existia antes de você ter ingressado na instituição militar. Por isso, é muito importante que você saiba o que é o Atestado de Origem, qual é a sua natureza e para o quê ele serve.
Da Natureza do Atestado de Origem (A.O.)
O atestado de origem (A.O.) é o documento administrativo militar elaborado por Oficial MÉDICO das Forças Armadas ou da Polícia Militar que visa atestar a relação de causa e efeito entre uma lesão/doença acometida por militar e o serviço realizado na caserna e/ou acidente em serviço.
Da Previsão Legal do Atestado de Origem
Tanto o Estatuto dos Militares Federais (Lei nº 6.880/80) como o Estatuto dos Militares Estaduais do RS (Lei Complementar nº 10.990/97) preveem o instituto do Atestado de Origem para resguardar direitos dos militares no caso de incapacidade ocasionada em decorrência de atos de serviço. Em relação a essa matéria a legislação das duas Corporações é praticamente idêntica.
Da Ausência do Atestado de Origem
De imediato, deve-se buscar dar conhecimento à autoridade competente sobre a lesão que o militar venha a sofrer por motivo de treinamento ou serviço para que ele tome ciência do fato. Providenciando assim, o documento que é definido como parte de acidente. E tal documento foi juntado na Sindicância Especial (Doc. 03) na página 06 em que podemos observar que foi confeccionado pelo próprio instrutor de Defesa Pessoal. Diante disso, e após a apuração do ocorrido, será gerado o AO ( Atestado de origem), pelo Oficial Médico Militar.
No caso do Médico ficar com dúvida se é caso de confeccionar o A.O., ou não, ele instaura o Inquérito Sanitário de Origem (ISO) que é uma perícia médica administrativa destinada a apurar a incapacidade física, temporária ou definitiva, em caso de acidente no ato de serviço.
Mas, o ISO somente é realizado no caso do AO não ter sido feito. Assim, existem 3 formas de instaurar o Inquérito Sanitário de Origem:
a) De ofício, pelo próprio médico no caso de encontrar-se com dúvida se a lesão é decorrente de acidente em serviço;
b) A requerimento do Comandante Militar ao médico para apurar se a lesão/acidente foi decorrente de ato de serviço; ou
c) A pedido do próprio militar acidentado no caso de omissão das autoridades acima mencionadas.
Importante salientar que instaurado o Inquérito Sanitário de Origem, será nomeado um encarregado para conduzir o procedimento que, obrigatoriamente, deve ser um médico militar de carreira.
Da Diferença entre ISO, AO e Sindicância Especial de Acidente de Serviço
Para entender o que ocorreu no caso em concreto é imprescindível fazer esta diferenciação. Como mencionado acima, Atestado de Origem (AO) é o documento administrativo elaborado por um médico militar em que atesta que a lesão/moléstia foi decorrente de ato de serviço. Inquérito Sanitário de Origem (ISO), por sua vez, é uma perícia médica que investiga se a lesão/moléstia foi decorrente de ato de serviço e somente é realizada quando o Atestado de Origem (A.O.) não foi feito. Os dois documentos estão previstos em LEI e ambos somente podem ser elaborados por um médico militar de carreira.
A Sindicância Especial de Acidente de Serviço não possui previsão em LEI e, sim, em portarias ou norma interna de instrução (N.I.) da Brigada Militar. São produzidas por oficiais do quadro de policiamento e sua finalidade é apurar se o acidente sofrido pelo militar foi decorrente de imperícia, imprudência, negligência ou simulação por parte do acidentado.
A finalidade da Sindicância Especial de Acidente de Serviço é apurar todos os fatos em que se deu o acidente. Descobrir se o investigado não deu causa para seu próprio acidente ou até mesmo simulou o acidente/doença para receber os benefícios decorrentes.
A Sindicância Especial, ao contrário do que muitos militares pensam, não é para apurar se o acidente foi decorrente de ato em serviço. Lembrando, como vimos acima, que o acidente em serviço somente pode ser provado por Atestado de Origem ou Inquérito Sanitário de Origem (Art. 116, § 1º da LC nº 10.990/97).
O primeiro documento dessa Sindicância é uma PARTE DE ACIDENTE EM SERVIÇO. Logo, ela só pode ser instaurada se o ato em que se deu o acidente tiver um mínimo de ligação com um ato de serviço. Pois, como o próprio nome já diz, ela é uma Sindicância Especial de Acidente de Serviço.
A Sindicância Especial é muito útil para apurar os acidentes durante o percurso do militar entre casa-trabalho-casa, que é considerada acidente em serviço (Art. 116, inc. II, letra “b” da LC nº 10.990/97). Infelizmente, alguns militares alegam que se acidentaram quando estavam deslocando para suas residências e descobre-se através dessa sindicância que seu acidente ocorreu enquanto ele trabalhava no seu “bico” que fica à quilômetros de distância em sentido contrário à sua residência.
A origem da Sindicância Especial de Acidente de Serviço era para apurar os casos em que o acidente resultou na morte do militar e verificar se o caso se enquadraria na legislação para que a viúva ou os dependentes recebessem a respectiva pensão militar. Com efeito, em casos como morte durante o percurso para residência ou trabalho dificilmente existiria um Atestado de Origem (A.O.).
Todavia, a Brigada Militar (a exemplo da PM dos demais Estados) resolveu inovar e assim criou a Sindicância de Acidente de Serviço Com Morte e a Sindicância de Acidente de Serviço Sem Morte. E esta última é a que causa confusão entre a oficialidade pois o desconhecimento gera a distorção da finalidade da sindicância.
Keops Castro de Souza - Advogado
OAB/RS 94.634
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